25.5.06

CAPELA DO STB


Gálatas 1. 6-24

Um Outro evangelho?

As igrejas da Galácia estavam sendo vítimas do proselitismo dos judaizantes. Paulo escreve esta epístola para corrigir esse desvio da doutrina da graça, desvio a que ele chama “outro evangelho” (1.9). Naturalmente muito diferente do evangelho que Paulo pregava.

I O Evangelho “de Paulo”

Era o evangelho da graça de Deus. O evangelho que nos revela um Deus santo, que ama o pecador, e que sacrificou o seu único Filho para que os homens, conscientes do seu pecado clamem a Deus por misericórdia e achem graça. Achem perdão, salvação, e esperança eterna.

O evangelho revela o desespero humano, e a graça maravilhosa de Jesus.

O evangelho é Cristocêntrico. Por isso Paulo anunciava Cristo crucificado, sepultado, ressuscitado. Anunciava a todos os homens a necessidade de arrependimento e a salvação pela graça, sem as obras da lei (2.16).

O evangelho de Paulo sublinhava o desespero humano sob o jugo do pecado, e a graça de Jesus revelada na cruz do calvário.

O Evangelho que Paulo pregava era um evangelho comprometido com a cruz de Jesus. Um evangelho de renúncia às paixões mundanas. Um evangelho em que o pecador salvo, rendido a Jesus, crucifica a sua carne com as suas paixões e concupiscências (2.20).

O evangelho de Paulo era o evangelho que produzia uma nova vida; uma nova esperança; seguia um novo caminho. Um evangelho baseada naquilo que Jesus fez e alcançou para nós no Calvário, e não naquilo que o homem é capaz de fazer por si mesmo.

O evangelho de Paulo era um evangelho sem fronteiras. Um evangelho que abrange tanto o judeu como o grego, o bárbaro, o cita, o servo e o livre. Um evangelho em que senhor e escravo, ambos se reconhecem pecadores perante Deus e se tratam como irmãos e em Cristo (Filemom 16).

II O “outro evangelho” pregado aos gálatas...

1. Era o evangelho da lei.

2. Era o evangelho da circuncisão. Paulo nega essa necessidade, e denuncia o erro fatal — Se vos deixardes circuncidar, Cristo de nada vos aproveita! (5.2).

3. Era um evangelho que regressava ao passado, observando dias, dietas alimentares, etc.

4. Era o evangelho que rejeitava a salvação pela graça e recuperava as tradições judaicas e a doutrina da salvação exclusiva dentro do judaísmo. Um cristão, para ser cristão, segundo os judaizantes, teria de primeiro tornar-se “judeu” e manter as suas tradições.

A raça era tudo. A hereditariedade... versus a graça universal de Jesus.

5. De alguma maneira, as doutrinas dos judaizantes tinham trazido às igrejas da Galácia alguma fricção e fragilização interna (5. 15).

Paulo denuncia energicamente o legalismo judaizante — Separados estais de Cristo, vós os que vos justificais pela lei; da graça tendes caído (5.4).

Tal como nos dias de Paulo, em todas as épocas surgem “outros evangelhos” que perturbam as igrejas.

III O “outro evangelho” de hoje

1. O evangelho da emoção e da experiência. A experiência pessoal e a emoção são tudo. Isto tem muito a ver com a perda dos absolutos. Tudo é relativo; logo, a tua experiência não é mais importante que a minha.
A experiência substitui a Palavra de Deus. Como se a Bíblia estivesse sendo ainda escrita hoje. Alguns grupos neo-carismáticos mais efusivos são frutíferos em profecias, em novidade... culto sem novidade não é culto...

Perde-se a autoridade da Palavra. Esta fica na sombra da experiência e das novas revelações.

2. O Pastor é mais um animador do que um profeta de Deus. Ele sente-se na obrigação de animar a plateia; de fazer o povo mexer-se, emocionar-se (rir ou chorar); fazer o auditório sentir-se bem. É para isso que o povo vai lá...
Em vez de cartas plenas de conselhos espirituais, criamos slogans destinados à comunicação de massa. Em vez de apresentar modelos de pasiência, entregamo-nos a conversas animadas e gritos de torcida para estimular o espírito da congragação. E, se o nosso grupo se recusa a se animar quando damos o sinal, partimos à caça doutra congragação, depois de mais outra, até concontrarmos pessoas tolas o suficiente para suportar esse tipo de inutilidade. (Petersen, Eugene; O PASTOR QUE DEUS USA; pags. 26-27).

3. Um evangelho fácil. Aceita Cristo! Cristo te ama e tem um plano maravilhoso para ti! Um evangelho que não confronta o pecador com a realidade, com a sua a culpa e a tragédia do pecado em sua vida. Um evangelho light... leve... suave... Um evangelho que não impôe nem produz mudanças morais na vida do que crê. Por isso olhamos para as nossas igrejas e vemos poucos modêlos dignos de serem copiados. O pensamento da juventude das igrejas acerca do sexo pré-matrimonial ou do aborto é muito semelhante ao pensamento dos jovens não salvos. Olhamos os temas dos acampamentos, dos encontros de jovens baptistas, e nem sempre conseguimos perceber qualquer ligação ou desafio nítidamente alicerçado na Bíblia.

Este evangelho está também associado a um evangelismo superficial, tipo fast em que o missionário pretende em dois ou três anos plantar uma igreja e deixá-la organizada... o povo que contribui no país de origem precisa de ficar com a ideia confortável de que valeu cada cêntimo que contribuiu para missões. Falta uma visão a longo prazo, que leve em consideração as culturas diferentes dos povos e seja capaz de investir longamente no trabalho. Talvez por isso Portugal não seja mais campo missionário dalgumas juntas que no passado trabalharam aqui. É que ninguém quer desperdiçar a sua vida num campo missionário difícil, temendo chegar ao fim da sua carreira sem deixar obra feita.

O “evangelho fácil” nota-se também na falta de cultura bíblica dos membros das igrejas, e no abandono daquele padrão tão sadio que exigia frutos dignos de arrependimento (à semelhança do que João Baptista fazia) nos candidatos ao baptismo.

O “evangelho fácil” nota-se também na decadência das nossas Escolas Bíblicas Dominicais. A revista da E.B.D. (Jovens e Adultos) algum tempo atrás limitava-se a indicar um ou dois versículos como leitura bíblica diária… a última que me chegou às mãos, já não traz leituras diárias!

4. Um evangelho utilitarista. Eu vou ao culto porque preciso. Não porque Deus tem direitos sobre mim.

5. Um evangelho sem compromisso. Um ser sem pertencer; um pertencer sem ser, do género: Eu creio em Jesus, frequento a igreja, mas não quero pertencer à igreja. Não quero compromissos... Ou... eu sou membro da Igreja, e quero continuar a ser, apesar de lá não ir nem contribuir...

Desvaloriza-se a Igreja... e surgem comunidades alternativas, que não assumem nem o nome nem o modelo de Igreja; que privilegiam a partilha, a comunhão, a auto-ajuda mas onde não há nem compromisso nem disciplina.

6. Um evangelho místico onde a palavra da fé (confissão positiva) pretende corresponder à palavra de Jesus... e ser o cumprimento das Suas promessas (fareis coisas maiores do que estas). Surgem assim as orações declarativas e determinativas... e essa moda mística vai tomando conta do dircurso dos púlpitos e das orações nas igrejas. Um evangelho que proclama, reclama e reivindica um novo pentecostes... um evangelho em que o espírito crítico dos mais bíblicamente esclarecidos é silenciado, sob o anátema de estar lutando contra a acção do Espírito Santo...

7. Um evangelho em que a pregação cede lugar ao “louvorzão”. Assim, vai-se ao “cultão”, ao “encontrão”, louva-se, grita-se, bamboleia-se, mas não há pachorra para a pregação (talvez também por culpa dos pregadores).

8. Um evangelho em que se banaliza o ser Pastor. Onde as qualificações exigidas para o ministério pastoral baixaram imenso. Um evangelho onde, desde que haja padrinhos, qualquer Simão mágico (Actos 8) é facilmente consagrado ao pastorado.

Conclusão

Como anunciar o evangelho de Cristo num tempo assim? Como ser relevante aos olhos de Deus? Haverá alguma esperança? Vejamos um pouco mais da nossa realidade.

1. Os pregadores da actualidade viajam muito mais rapidamente e confortavelmente que os do século passado, mas sentem-se muito mais cansados que eles e são muito menos produtivos!

2. Os pregadores hoje têm muito mais livros na sua biblioteca que os do século passado, mas lêm muito menos a Bíblia.

3. Os pregadores da actualidade conhecem mais de psicologia humana, de sociologia e de pedagogia, mas são de menos ajuda ao homem moderno com seus problemas e crises morais.

4. Os pregadores hoje estão rodeados de tecnologia. Usam telemóveis; têm som nas suas igrejas, data-show nos cultos; estão ligados à Internet; têm páginas na Internet; produzem boletins e outros materiais com muito boa qualidade gráfica, mas têm menos poder na pregação e são menos eficientes na conquista de almas.

5. Os pregadores hoje estão mais preocupados com a estética dos seus templos do que na vida espiritual das suas ovelhas.

Nós precisamos ser a geração da mudança, da redescoberta dos valores do evangelho, à semelhança do que fizeram Thyndale, Lutero; os puritanos ingleses; os irmãos Wesley e outros.

Eles cultivaram uma vida de intimidade com o Senhor; eles temiam envolver-se em pecado; eles voltaram à Bíblia como única fonte de doutrina e norma de conduta cristã. Eles experimentaram o fogo do Espírito Santo impulsionando-os no testemunho; na expansão missionária. Eles pregavam quando era preciso e mesmo quando não estavam preparados.

Precisamos fazer como os povos do passado que, quando derrotados, fugiam das suas cidades ou eram levados cativos. Quando regressavam, as suas cidades estavam queimadas e totalmente destruidas. Eles então removiam as cinzas, limpavam o entulho, procuravam as pedras que restavam, descobriam os velhos alicerces e reconstruiam a sua cidade, agora ainda mais forte que no passado.

Os alicerces sobre os quais precisamos reconstruir são os mesmos sobre os quais Paulo construiu. Ele escreveu aos Coríntios: Mas para os que são chamados, tanto judeus como gregos, lhes pregamos a Cristo, poder de Deus e sabedoria de Deus ( ...) Porque nada me propuz saber entre vós, senão a Jesus Cristo, e este crucificado. (I Cor. 1. 24; 2.2).

Não precisamos dum outro evangelho, mas do EVANGELHO!

Pastor José Pinto Ferreira
2006/05/23